As Tecnologias na Educação pela UNESCO

(Artigo originalmente publicado no jornal quinzenário João Semana de 1 de agosto de 2023)

Nos passados dias 26 e 27 de julho, foi publicado o relatório “A tecnologia na educação: Uma ferramenta a serviço de quem?”  com a chancela da UNESCO. O evento de lançamento aconteceu em Montevidéu (Uruguai), tendo contado, entre outros, com a presença de 15 Ministros da Educação.

O documento está disponível em inglês, mas existe um resumo oficial do mesmo em português, disponível no mesmo sítio na Internet. O relatório que envolveu muitos investigadores de diferentes países na sua conceção, apresenta dados de vários países, sendo que uma das principais conclusões que se pode tirar é um apelo generalizado, por parte dos autores, para que na educação as tecnologias sejam utilizadas de forma adequada.

O relatório é claro, apresenta casos concretos e evidencia algumas das vantagens da adoção das tecnologias digitais na educação, o que o torna uma leitura de interesse para docentes, investigadores e decisores políticos. Todavia, também cita provas que demonstram que os benefícios da aprendizagem desaparecem se a tecnologia for utilizada em excesso ou na ausência de um professor qualificado.

Como noutras áreas da atividade humana, na educação, a introdução de uma nova tecnologia é, por vezes, incentivada pelas empresas que a desenvolveram ou por empresas distribuidoras. Veja-se, por exemplo, a quantidade de palestras sobre a temática que são patrocinadas ou organizadas por essas empresas. Daí que, muitas vezes, a discussão em torno da adoção de determinadas tecnologias seja deturpada com falsos pretextos, sendo, em alguns casos, difícil de diferenciar ciência de mera propaganda publicitária. Este relatório não ignora esse facto e refere também outros aspetos que têm sido comummente ignorados (citando o resumo):

– Evidências sólidas e imparciais do impacto da tecnologia educacional são escassas;
– A tecnologia pode ser uma salvação para a educação de milhões, mas exclui muito mais pessoas;
– Algumas tecnologias educacionais podem melhorar alguns tipos de aprendizagem em alguns contextos, mas a tecnologia deveria se concentrar em resultados de aprendizagem, e não em contribuições digitais;
– O ritmo acelerado das mudanças na tecnologia tem pressionado os sistemas a se adaptarem;
– O conteúdo online aumentou sem que houvesse regulamentação suficiente de controle de qualidade ou diversidade;
– Compra-se tecnologia, muitas vezes, para “tapar um buraco”, sem olhar para os custos no longo prazo para orçamentos, bem-estar das crianças e para o planeta (UNESCO, 2023, p. 7-8).

O relatório aponta ainda que as discussões sobre tecnologia na educação focam-se, muitas vezes, na tecnologia ao invés de se focarem na educação. Ou seja, no desenvolvimento humano que, efetivamente, estas poderão proporcionar. 

Este relatório, na minha opinião, deve servir de motivação para que se desenvolva investigação na área de forma transversal, contínua e independente (uma vez que a falta de independência de algumas opções é também referida no documento).

Na mesma linha de pensamento, podemos ignorar que, quando falamos de tecnologias para a educação, deixamo-nos levar muitas vezes pela emoção do momento, especulação ou até pela novidade, esquecendo que a educação é essencialmente humanizar e que uma tecnologia para ser efetiva não tem de ser avançada. Assim como expor uma criança a novas tecnologias só porque são novidade não significa melhorias na aprendizagem ou mesmo na inclusão da mesma.

Após a leitura, fica evidente o apontamento dos autores no sentido das tecnologias a serem introduzidas na educação o sejam com base em evidências científicas (independentes) e que estas atendam aos interesses reais dos estudantes e sejam um complemento à interação humana.

Filipe T. Moreira

Professor do Ensino Superior Politécnico e Investigador no DigiMedia – Digital Media and Interaction Research Centre da Universidade de Aveiro