A Netflix lançou hoje (9 de setembro de 2020) um documentário intitulado “O Dilema das Redes Sociais” que ao longo de cerca de uma hora e trinta minutos nos vai mostrando como as “redes sociais” evoluíram de algo que, à partida, seria positivo para algo que tem contribuído, à escala global, para, entre outros, a polarização das opiniões e comportamentos.
No decorrer do documentário vão surgindo diversos protagonistas que em determinado momento das suas vidas tiveram um papel fundamental na construção do que são hoje as diferentes “redes sociais”. Como seja o antigo presidente da Pinterest, da Facebook e também antigos responsáveis da Google. Surgem ainda engenheiros informáticos, designers e investigadores de relevo na área. Ou seja, todo o documentário tem contributos de indivíduos que conhecem o “sistema” por dentro ou que o estudam há vários anos. Aliás, este pode ser mesmo o grande estímulo para ver e rever este filme.
Todo o documentário vai-nos levando por diversas reflexões, mesmo sobre alguns aspetos que parecem óbvios, mas que antes de os vermos verbalizados parecem não figurar no consciente.
Se no passado a tecnologia servia para resolver problemas, no presente as tecnologias digitais trouxeram outra dimensão, isto porque ao criarem novos mundos (ainda que muitas vezes distópicos) criaram também novos problemas. Nomeadamente a questão da viciação causada, em parte, pelas tecnologias persuasivas, também explicadas e demonstradas no documentário. Sendo que umas das técnicas usadas é precisamente o de surgirem apenas conteúdos relacionados com os interesses e comportamentos do utilizador, fazendo com que este comece a ver apenas informação de pessoas que pensam como ele, dando-lhe a sensação de que todos pensam da mesma forma. Isto é apontado por muitos como sendo umas das principais razões da polarização de ideias e do surgimento de conflitos culturais.
Outro tema abordado é o facto das empresas que dominam as “redes sociais” verem as pessoas como um simples código, traçando-lhes o perfil e fazendo destes consumidores compulsivos, sem que os próprios tenham noção disso. Isto faz com que estas empresas lucrem milhões à escala global (no entanto, continuam a pagar impostos apenas em alguns países). Sobre isto, é ainda abordado um facto, não menos interessante, que se prende com a publicidade para crianças estar (em muitos países) regulamentada (principalmente no respeitante à televisão), no entanto, para as redes sociais estas mesmas normas de publicidade não se aplicam. O principal fator que determina a publicidade que o utilizador vê prende-se com o seu comportamento e interesses demonstrados online.
As “fake news” são também abordadas, surgindo o alerta de que a Inteligência Artificial (tecnologia fundamental no processo de viciação das “redes sociais”) não tem capacidade para as filtrar ou detetar. Aliás, é mesmo citado um estudo desenvolvido no MIT onde se concluiu que as “fake news” se propagam 6 vezes mais rápido do que informação verdadeira nas “redes sociais”. Este facto tem contribuído em muito para o surgimento de diversas teorias da conspiração, sendo talvez a mais conhecida a da Terra plana.
Sem querer desvendar muito mais sobre o documentário, é ainda dado o exemplo dos efeitos adversos da manipulação através de algoritmos, mas também por governos e outras entidades, dando-se como exemplo o que se tem vivido em Mianmar.
Em jeito de conclusão, serão as “redes sociais” realmente redes sociais ou redes de viciação e polarização?
Penso que este documentário será um excelente ponto de partida para uma discussão abrangente sobre esta questão. Até porque, apesar de no meu texto ser dado um toque negativista, no documentário é também indicado como muitas das ações e desenvolvimentos ocorridos nas “redes sociais” foram inicialmente uma ideia inocente que se foi desvirtuando com o tempo.
Aqui pode ver a apresentação do documentário:
Filipe T. Moreira