Artigo de Opinião publicado, originalmente, no quinzenário de Ovar “João Semana” (1 de dezembro de 2023).
Os telemóveis, especialmente os smartphones, tornaram-se um elemento constantemente presente no nosso dia a dia. De tal forma que, muitos de nós, quando não temos estes equipamentos ao alcance da mão sentimos alguma ansiedade – um dos sinais da nossa dependência.
Na última década e meia os smartphones evoluíram muito e são hoje ferramentas muito poderosas, substituindo, em muitos casos, outras tecnologias nas nossas vidas como as câmaras fotográficas, o relógio, a televisão, os leitores de cassetes/dvd, o computador, o tablet, a rádio, entre outros, como os mapas ou bússolas. Tornaram-se ainda o dispositivo preferido de milhões para aceder à Internet e para comunicar com outros. Têm contribuído muito para a ubiquidade do acesso à informação (mas não necessariamente para o desenvolvimento do conhecimento).
Esta presença dos smartphones nas nossas vidas tem dado origem a vários estudos sobre o seu uso em diferentes contextos. Um desses estudos foi desenvolvido pela onepoll.com em colaboração com a operadora telefónica Three UK. Este estudo foi realizado apenas no Reino Unido e teve como público-alvo pais (1000 no total) com filhos com idade igual ou inferior a 6 anos.
Este estudo surgiu na comunicação social com o destaque para o resultado que indicava que 43% dos inquiridos afirmavam não saber como é que as pessoas educavam os filhos antes dos smartphones. Isto porque os smartphones estão também a substituir formas de ludicidade mais tradicionais ou mesmo de acesso a informação, de tal forma que 61% dos respondentes afirmou que é a ferramenta mais útil para educar os seus filhos e chegam mesmo a utilizar o telemóvel até 77 vezes por semana para procurar conselhos.
Estarão os smartphones a “substituir” as tradicionais redes alargadas na educação das crianças? Não creio, e também não o conseguimos saber através deste estudo. Até porque não tive acesso às perguntas que foram usadas no questionário e isto é muito importante porque a forma como se faz uma pergunta pode condicionar as respostas.
Quando se perguntou aos pais para que é que utilizam mais os seus dispositivos, 67% responderam que os utilizam para tirar fotografias, 62% para enviar mensagens via WhatsApp e 60% para ver o estado do tempo. Em paralelo, o estudo também concluiu que 36% dos pais descobriram que o download e streaming de conteúdos para os seus filhos eram um dos maiores motivos para o gasto de dados móveis, com uma média de 12 horas de streaming por semana.
Neste último resultado é que reside o busílis da “questão” e deveria ter sido este o ponto que a que comunicação social deveria ter dado o destaque. Porque não tem mal que os pais usem os telemóveis para pesquisar informação ou que tenham dificuldade em perceber como é que os seus próprios pais o educaram. O problema é quando temos crianças (com 6 ou menos anos de idade) que passam tantas horas agarradas ao pequeno ecrã seja a assistir vídeos de streaming, seja a jogar ou em redes sociais. Quando existem tantas alternativas para passar o tempo de forma lúdica e que permita um desenvolvimento mais adequado para as crianças.
É possível que a realidade em Portugal não seja muito diferente da do Reino Unido, aliás a experiência que tenho em diferentes ambientes educativos aponta nesse sentido. O que evidencia a necessidade de uma maior sensibilização para estas questões e de formação tanto de pais como de crianças e jovens.
Voltarei a este tema na próxima edição.
Filipe T. Moreira
Professor do Ensino Superior Politécnico e Investigador no DigiMedia – Digital Media and Interaction Research Centre da Universidade de Aveiro